domingo, 20 de novembro de 2011

O Senhor do Luxo - Grupo JHSF

O senhor do luxo Com uma estratégia voltada aos clientes de altíssima renda, o empresário José Auriemo Neto fez da JHSF a empresa que mais se valorizou no setor de construção em 2011
Por Ralphe MANZONI JR. e Carlos Eduardo VALIM
Quando se mudar com sua mulher, Mariana, e seus três filhos, em 2012, para o edifício Tuias, no Parque Cidade Jardim, um audacioso empreendimento que engloba nove torres residenciais, três prédios comerciais e um shopping center repleto de grifes internacionais de luxo, o empresário paulista José Auriemo Neto, 35 anos, não demorará mais do que dez minutos para percorrer o caminho entre sua casa e o escritório, localizado no 26º andar de um dos edifícios comerciais do complexo. Isso não significa que Zeco, como é mais conhecido o presidente do grupo JHSF, ficará encastelado no seu palácio às margens do rio Pinheiros, em São Paulo. Até porque, ele gosta de gastar, literalmente, sola de sapato. Recentemente, Auriemo deixou uma reunião no centro e pegou o metrô para conhecer a recém-inaugurada linha 4. “Temos de viver as cidades em que atuamos, saber o que está acontecendo, as tendências e o que as pessoas estão pensando”, diz Auriemo. Nos fins de semana, ele pega o carro ou o helicóptero e sai pela capital em busca de bons terrenos para construir os seus empreendimentos. “Essa é a nossa matéria-prima”, afirma. Quando não está atrás de espaços para erguer seus negócios, ele pode ser visto entregando as chaves para os lojistas do shopping que está construindo em Salvador, na Bahia, ou em um torneio hípico na Fazenda Boa Vista, em Porto Feliz, no interior de São Paulo, promovido pela JHSF para atrair mais clientes endinheirados aos seus projetos.
José Auriemo Neto: "Temos de viver as cidades em que atuamos,
saber o que está acontecendo e o que as pessoas estão pensando"
Em São Paulo, ele costuma chegar cedo ao escritório, por volta das 8h15. Só sai de lá depois das 21 horas. Para ele, trabalho e lazer são palavras que se confundem em seu dia a dia. Tanto esforço assim parece estar sendo recompensado. No dia 11 de novembro, a JHSF, que atua no ramo de incorporação, shopping centers, prédios residenciais e comerciais e hotéis com a marca Fasano, apresentou os resultados financeiros do terceiro trimestre de 2011. Os números impressionam. A receita bruta chegou a R$ 703,2 milhões nos nove primeiros meses deste ano, alta de 56% ante o mesmo período do ano passado. O lucro líquido teve um salto de 253%, atingindo R$ 170,6 milhões no acumulado dos três trimestres. A geração de caixa triplicou, chegando a R$ 231,8 milhões. Essas não são as únicas boas notícias para Auriemo. Entre as ações das companhias do mercado imobiliário, listadas na Bovespa, as da JHSF são as que mais se valorizaram em 2011. Até o dia 16 de novembro, haviam acumulado alta de 30,3%.
No mesmo período, o Ibovespa caiu 15,5%. Mais: de 19 companhias abertas do setor, apenas três estavam se valorizando neste ano. As demais amargavam quedas expressivas, como a Brookfield (- 28,5%), MRV (- 28%), PDG (- 28,1%) e Gafisa (- 52,4%). “A JHSF surpreendeu positivamente, principalmente por conseguir ampliar sua rentabilidade, que já se encontrava em patamares consideravelmente elevados para o setor”, diz Wesley Pereira Bernabé, analista da BB Investimentos.Por trás do desempenho da JHSF está a aposta em um segmento que vem passando ao largo da crise financeira global: o mercado de luxo. Os números fundamentam essa estratégia. Em 2011, o mercado de artigos de luxo deve faturar R$ 20,9 bilhões no Brasil, segundo pesquisa realizada pelas consultorias MCF e GfK. Trata-se de um crescimento de 38% sobre o ano anterior. O número de brasileiros com mais de US$ 1 milhão para investir chegou a 155 mil em 2010, de acordo com a Merrill Lynch e a Capgemini. Em 2005, eram 109 mil. Detalhe importante: desse universo, 85% têm mais de US$ 30 milhões para gastar. Estudo elaborado pela Real Capital Analytics (RCA), empresa de Nova York especializada no mercado imobiliário mundial, mostra que o setor atingiu, no Brasil, o volume recorde de investimentos estrangeiros em grandes propriedades: US$ 3,5 bilhões no terceiro trimestre de 2011.
Só entraram nessa conta prédios comerciais e imóveis residenciais com preços acima de US$ 10 milhões. “O Brasil é claramente um destaque no mercado imobiliário global”, disse à DINHEIRO Dan Fasulo, diretor-geral da RCA. Não bastasse esse bom desempenho do mercado de luxo, o segmento imobiliá­rio de altíssima renda conta com características próprias que favorecem a JHSF, em comparação com os seus rivais de construção civil apoiados na expansão dos financiamentos e do aumento do poder aquisitivo da classe C. Um desses fatores é a oferta de crédito. Em uma situação de redução do ritmo de crescimento, como a atual, o financiamento começa a minguar e as regras de concessão de empréstimos ficam mais rígidas. Os clientes de Auriemo, ao contrário, não dependem do mercado financeiro para investir nos empreendimentos da JHSF. No complexo Cidade Jardim, por exemplo, a quantidade de financiamentos foi inferior a 6% do valor total de vendas. Em novos projetos, como os prédios residenciais Vitra e Praça Vila Nova, ambos em São Paulo, e a Fazenda Boa Vista, em Porto Feliz (SP), não houve dinheiro dos bancos envolvidos. “Não estou sujeito ao humor bancário”, afirma Auriemo, que financia diretamente seus clientes milionários –cuja identidade é guardada em segredo – em prazos que não ultrapassam os 36 meses.
Outro fator que colabora com a estratégia da JHSF são os ventos desfavoráveis da economia mundial, o que faz os investidores buscar ativos mais seguros. “A classe A voltou a investir em imóveis como reserva de valor no médio e longo prazo”, diz Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP, sindicato da habitação. Para capturar os milionários brasileiros, Auriemo segue também uma fórmula aparentemente simples: localização excelente dos empreendimentos e arquitetos e designers de renome mundial. O complexo Parque Cidade Jardim ilustra bem essa filosofia. Construído ao lado da Marginal do Rio Pinheiros, era um local improvável para um empreendimento luxuoso. Até seu pai, Fábio Auriemo, achou inicialmente a ideia absurda. Mas desde o lançamento, em 2006, o metro quadrado dos prédios residenciais valorizou-se 179%. Outro exemplo é o recém-lançado Vitra, residencial com 14 apartamentos com unidades de 565 até 1.145 metros de área. O prédio foi projetado pelo premiado arquiteto polonês, naturalizado americano, Daniel Libeskind, responsável pelo plano de revitalização do ground zero, local onde estavam as Torres Gêmeas, em Manhattan, destruídas no 11 de Setembro. “O Vitra criará um novo ícone para a cidade de São Paulo”, afirmou Libeskind à DINHEIRO.
Auriemo é, desde 2007, sócio majoritário dos hotéis Fasano, que cada vez mais fazem parte das incorporações da JHSF. “É uma tendência as incorporadoras terem marcas hoteleiras”, afirma o restaurateur Rogério Fasano e idealizador da rede de hotéis que leva seu sobrenome e atual dono de uma participação minoritária. Esses ingredientes, isoladamente, não bastam para cativar o cliente de alta renda. É preciso gastar muita energia para conquistá-los. Auriemo chega a se envolver pessoalmente em muitas vendas. Quando necessário, aluga jatos executivos para levar os interessados até Punta del Este, no Uruguai, onde está localizado o empreendimento Las Piedras. O fato de circular nas rodas da alta sociedade e de participar, com frequência, de festas de potenciais clientes, facilita o seu trabalho de caça aos donos do tesouro. Ele próprio chega a organizar eventos, como o almoço em homenagem à bilionária Camilla Al-Fayed, irmã de Dodi Al-Fayed, o último namorado da princesa Diana, no começo de novembro, em São Paulo.
Em outubro deste ano, a JHSF organizou também a Copa Hermès de Hipismo, a primeira realizada fora da França, que levou um público altamente qualificado e endinheirado à Fazenda Boa Vista. “Isso alavanca muito o conceito do empreendimento”, afirma Fernando Machado, diretor comercial da JHSF. “Não vendemos apenas metro quadrado.” Apesar de todo o glamour, Auriemo é bastante cauteloso e pé no chão. Antes de se lançar em um novo negócio, ele estuda cada detalhe. “Zeco costuma dizer que é preciso fazer conta de padaria”, diz Richard Barczinski, membro do conselho de administração da JHSF e que gerencia as marcas Hermès, Jimmy Choo e Pucci no Brasil. O rigor com o controle dos custos levou a JHSF a voltar à área de construção em 2008. Atualmente, 60% das obras são tocadas por sua própria equipe. O restante é terceirizado. Mas, nesse caso, há um contrato de risco. Se ocorrer atraso, quem arca com o prejuízo é a empresa contratada. É essa receita que Auriemo espera aperfeiçoar com os seus novos empreendimentos. Na semana passada, a JHSF anunciou o lançamento do Cidade Jardim Shops, um shop­ping de dimensões mais compactas que abrigará marcas como Hermès, Pucci, Jimmy Choo, Carolina Herrera e Salvatore Ferragamo, queridinhas do clube dos milionários.


A doceria parisiense Ladurée, que fornecia ao imperador Napoleão III, também se instalará por lá. Ele será localizado no terreno do antigo restaurante Fasano, na região da Oscar Freire, rua que reúne uma das maiores concentrações de lojas de luxo de São Paulo por metro quadrado, e terá ligação com o vizinho Hotel Fasano. Com investimento estimado em R$ 80 milhões, o shopping tem previsão de inauguração no primeiro semestre de 2013. A tacada mais ambiciosa da JHSF, no entanto, é a construção de uma minicidade a 60 quilômetros de São Paulo. Batizado de Catarina, o projeto baseia-se no conceito americano de criar cidades em volta de metrópoles e contará com residências, centro empresarial, ponta de estoque com marcas de luxo, universidades e até uma pista de pouso para jatos executivos. A JHSF também pretende reforçar sua presença na área de shoppings e escritórios para locação, com mais três empreendimentos, que deverão ser entregues em 2012: o Shopping Metrô Tucuruvi, em São Paulo, o Shopping Horto Bela Vista, em Salvador, e o Shopping Ponta Negra, em Manaus. O Parque Cidade Jardim também será ampliado.
Até 2015, essa área deve produzir uma geração de caixa superior a R$ 400 milhões. Será um salto e tanto. Nos nove primeiros meses de 2011, os shoppings e a locações comerciais produziram uma receita bruta de R$ 48,7 milhões contra R$ 608,1 milhões das incorporações. A concorrência nessa área, porém, é cada vez mais acirrada. “Há demanda dos clientes por shoppings de luxo, mas já não há tanto espaço para novos empreendimentos”, diz Carlos Ferreirinha, presidente da consultoria MCF, especializada no mercado de luxo. Em São Paulo, por exemplo, próximo ao Parque Cidade Jardim, está sendo construído o Shopping JK, do rival Iguatemi, da família Jereissati. Caberá a Auriemo manter a tradição de quase 40 anos de sua família na área do luxo. A JHS foi fundada em 1972 por Fábio e seu irmão José Roberto. Em 1991, eles se desentenderam e cria­­ram duas empre­­­sas: a JHSF (o F é de Fábio) e a JHSJ
Auriemo deu mostras desde cedo que tinha pressa. Aos nove meses, começou a andar. Com dois anos, já pedalava bicicletas sem as rodinhas de apoio. Com nove anos, aprendeu a dirigir. Na adolescência, começou a montar a cavalos. Nessa época, já acompanhava o pai em reuniões. Cursou engenharia na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap) e depois se transferiu para a Faculdade de Engenharia São Paulo. Abandonou o curso no quarto ano e não o concluiu. Com 17 anos, começou a trabalhar na incorporadora na área de serviços. Dez anos depois, assumia a presidência do grupo. “Foi um processo planejado e cuidadoso”, afirma Auriemo. Aos 35 anos, é o mais jovem da cúpula da empresa, cuja média de idade na diretoria-executiva é superior a 50 anos. A pouca idade desaparece de cena pela desenvoltura com que discute assuntos de negócios. “Tenho a vantagem de ser jovem em uma empresa antiga”, diz ele. “Essa é uma boa equação.”